domingo, 31 de março de 2013

Impressão: Trabalho de convivência e pesquisa - Moradores de Rua

por David Vega.

A tradição etnográfica, sobretudo de uma boa parcela daqueles que a fazem principalmente na America Latina, tende na maioria das vezes a não se livrar da virtude cristã em compreender o objeto de estudo com base de que “tais grupos são o tiro inicial” do antagonismo clássico entre estabelecidos e outsiders (forasteiros). É como se aqueles que estão à margem não pudessem ter suas próprias razões, códigos de conduta e até sua própria violência (ou justiçamento interno) como gosto de enxergar na maioria dos casos.

"As mudanças históricas na sociedade convencional também estão em continuidade com o esquema cultural suplantado, enquanto a nova situação vai adquirindo uma coerência cultural de natureza distinta. Assim, procuro examinar como os grupos não estabelecidos lutam por integrar sua experiência do sistema mundial em algo que é mais lógico e inclusivo: seu próprio sistema de mundo". - citação de Djanires Lageano de Jesus.


O comportamento dos moradores de rua em relação o espaço (a cidade, o meio, o abrigo), com o conjunto de sua cultura material e com seus corpos conformam os eixos centrais da análise etnográfica. Através da descrição dos lugares, dos objetos, dos gestos, das atitudes deste sujeito, se enfatiza o caráter nômade de seu estilo de vida, divergente e contraditório para a sociedade sedentária.
 
Cada caso, é um caso, não seria possível traçar uma linha estruturalista como a de Levi Strauss, no caso dessa pesquisa, resumir-se apenas a isso seria negligenciar os motivos pessoais de cada indivíduo que acabou tendo as ruas como moradia. Em suma maioria, na cidade de São Paulo, os casos estão totalmente ligados ao uso de drogas, indiscriminadamente o “crack”. Porem encontrei uma quantidade considerável de pessoas que assim acabaram, devido desilusões de todo tipo, amorosas, dívidas, insegurança e a falta de uma base concreta para que os mesmos possam se manter. Há também os que estão nessa por opção, aqueles sobretudos de culturas que enxergam a vida por outras óticas, e escolhem o nomadismo como estilo de vida, se recusando enquadrarem-se nas instituições legalistas.

Um número crescente de moradores de rua procuram as internações, mas há a falta de leitos, o que faz com que negócios paralelos surjam; como aqueles que estão na rua uma quantidade de tempo maior, e acabam por desenvolver “negócios”. Com esses negociantes, você consegue marcar banho, almoço e uma noite nos leitos, por preços que variam. São pessoas influentes dentro desse escopo, que cobram para por o nome do sem teto no centro de acolhimento, que lhe seria de direito. (OBS: Esses negociantes também são moradores de rua, esse poder paralelo está além da vigilância legalista).

Quando alguns me perguntam os motivos que me levaram a esse trabalho, não consigo eleger alguns poucos, seria uma injustiça citar dois ou três e desprezar os demais, porém gosto muito de uma citação do escritor uruguaio Eduardo Galeano, que diz o seguinte:

"Muitos jovens, em uma fração absurdamente majoritária, de boas condições financeiras na América Latina, conhecem os bares de Paris, as boates de Miami e os teatros de Nova Iorque. Aprendem a se locomover no metrô de Londres e a perguntar em inúmeros idiomas "onde fica o banheiro", porém quando estão nas suas cidades natais não vão à esquina caminhando ou ao centro de ônibus, e muito menos conhecem os subúrbios de seus bairros, quem dirá os de suas cidades".

 Livro: Patas Arriba - La Escuela del Mundo al Revés.

Contatos:
davidvega.com.br
dvega10@hotmail.com 

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