terça-feira, 26 de março de 2013

Marrocos



Certa vez estava fumando um cigarro no parque, sem compromissos ou pensamentos, vi um casal de crianças que brigava por um saco de balas de jujuba, a mãe chamava a atenção desses dois irmãos que pareciam se odiar nesse momento de fúria. O menino loirinho puxava o saco para seu lado e a bonequinha de cachinhos gritava com o rosto todo vermelho puxando-o para o seu. Fiquei ali imóvel esperando ver no que dava e como previsto, o saco rasgou espalhando as balas de juba para todos os cantos, as crianças choravam e o chão passou a ser uma salada de cores.
Nunca me esqueci dessa imagem, hoje a relaciono com uma gravura que ilustrava meu livro de História, ainda no ginásio. O cartaz era da época do colonialismo na África, já se aproximando da data da 1ª Grande Guerra; nela, uma lebre tinha cada pata sendo puxada para um canto com o mapa da Europa por detrás. Um homem representando a Espanha ficava com as orelhas, as patas dianteiras eram puxadas para o lado da França, e as traseiras se esticavam até a Alemanha. Essa charge representava a situação do Marrocos, no caso, a “lebre”, na época.
Aquela nação brava, devido sua localização geográfica, foi palco de diversas batalhas entre povos que tentaram ter-la sobre seu controle. Desde fenícios, persas e berberes, legiões romanas e cartaginesas em guerras púnicas, invasores visigodos e suevos… As areias quentes cobrem as ruínas de pedra sob um sol escaldante que se estende até o Saara, quando tropas de Abd-El-Krim conquistaram os saaruís, unificando as tribos da África árabe. Nem mesmo a Legião Estrangeira, nem o grande poder de Cristo foram páreos para os filhos de Alá.
Derrotados em terras estrangeiras pela opressão da Inquisição, desde a Ibéria às portas das ilhas italianas do mediterrâneo, muito de seus costumes e cultura deixaram, o encanto da mouraria no Algarve e a melancolia dos gitanos pelas noites de cantoria da mulher andaluza, as diferentes nações/tribos marroquinas nunca deixaram se dominar em casa e hoje essas grandes potências européias que a disputaram choram feito aquelas duas crianças que vi no parque, a ONU chama a atenção como aquela mãe desesperada mediando o conflito de seus filhos e seus clãs de imigrantes se encontram pelos quatro cantos do planeta, mesclando seus rostos amorenados entre povos de todas as cores, feito aquelas balinhas de jujuba espalhadas.

Crônica de “O Quarto Ponteiro”, David Vega (2011)

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